Ultrapassagem
(Víctor Lemes)
Desperdiçar o futuro, o passado e o presente. É só o que eu tenho feito, desde aquela festa de 5 anos. Vi que o egoísmo e a mentira eram duas ótimas comparsas, pra quem queria ter tudo, fazer tudo. Quantas vezes, eu não sentei ao pé da cama, com uma bíblia em minhas mãos, e com lágrimas no rosto, me perdia de mim mesmo, conscientemente. E desperdiçava mais uma vez a sorte que me acompanhava. Desperdiçava-a, como meu futuro, meu passado e meu presente.
E foi como um contrato com o diabo escolher tais caminhos, pois o preço foi perder minhas mais belas memórias. Hoje, eu não lembro muita das cenas que podem ter sido belas, e marcantes da minha infância, com minha mãe... Há muito a faço chorar, e me iludo com meus egoísmos, que me fazem fazer parte do mundo. Que eu hipocritamente, me outorgo ‘diferente’. Não quis entender o porquê das discussões, só pensaria em mim, daquele dia em diante.
Há aquelas vezes, raras, em que eu percebo o quão este pecado está grande. E me recuso a refletir, novamente, sobre meu futuro, meu passado e meu presente. Eu li livros, conheci-o de perto, senti teu abraço, e ouvi suas gargalhadas, mas não chorei em sua morte... Não me pus em seu lugar, de verdade. Não despertei a compaixão verdadeira. Eu não sei amar, embora saiba o que é. Não posso reclamar de ignorância sobre como a vida funciona, como o mundo gira, e o quê a gente leva. Eu sei, mas minhas atitudes perante o mundo, ainda são confusas, são falsas.
Assim como o carnaval, visto as máscaras pra ir dançar, literalmente. Depois de anos de treinamento, com aqueles que foram os espelhos, que eu não escolhi, mas escolhi, o vício de querer se perder de mim, ainda me persegue. Assim como qualquer viciado, eu sei que a escolha foi minha, e sou eu quem sabe mudar. Existem as ações que meu coração faz, e há aquelas que a máscara o faz. Se eu soubesse o quão errado me tornaria agora, teria ouvido minha sorte, teria aprendido cedo a ouvir a intuição. Eu já não tenho os sonhos, que tinha. Machuquei-me, mas feri mais quem sempre tentou me ajudar. Agora esfrego meus olhos, até ficarem vermelhos, pra assim poder chorar...
Escrevo isto tudo, para alguém ler, ou para que meu ego cresça e me governe todo? Eu, sinceramente, não sei mais... Pois eu me perdi, eu aceitei querer me perder, e desconhecer-me de mim mesmo. Que eu aprenda, por favor, que eu aprenda, da forma que seja. Eu não entendo a simplicidade do mundo, não entendo.
Que eu sofra pra aprender, pois eu sei que já a fiz criar muitas marcas, muitas lágrimas, muitas... Eu mereço a dor que me aguarda, e que será bem maior das que causei. E que eu reencontre minha dignidade. Que eu realmente confie naquele que não vejo. Que eu possa trazer esperança, além de apenas palavras. Que eu cresça, e saiba caminhar com as próprias pernas, e que na hora de voar, eu não tenha medo da altura do penhasco...
Eu estou neste ônibus, indo pra um lugar definido. Eu posso mudar esse caminho, posso descer desse ônibus. Mas ele está em alta velocidade, não consigo ver as árvores, somente a mancha-verde que segue as janelas. Um caminhão está à nossa frente, e o ônibus, decide arriscar-se e a nós, e está a ultrapassar aquele caminhão. Acontece que há outro à nossa frente, que desvia de nossa falsa segurança, mas já o próximo choca-se contra nós.
Foi ali, saber que uma vida vale tão pouco hoje em dia. Um dia quero lutar por algo melhor pra mim, que também seja melhor pra vocês.
Naquele dia, morri.
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