(Víctor Lemes) Há uma porção de meias para dobrar e guardar nas gavetas, mas tenho evitado abri-las. Andei pensando muito pela manhã e durante o almoço, tanto que minha mãe percebeu e me perguntou: "o que está pensando?", e simplesmente respondei que estava a pensar em nada. Contudo, quem pensa em nada não existe. Quando digo tchau a alguém, não me despeço com beijos no rosto, como os antigos fazem; acho que evito não criar tantos elos com a pessoa. Não quero entrar num transe lúdico novamente. Então, evito o contato direto, o contato mais próximo. Evito palavras pronunciadas, baixo o tom da minha voz, aumento o volume dos fones de ouvido, ouço os telefones tocarem sem algum ruído, e finjo que para os outros sou um desconhecido. Trago comigo as bençãos de todos, guardo-os nos bolsos... Vejo outros jovens pelas ruas de passarinhos azuis, desesperados em quietude, desapontados em inércia, perdidos sem se encontrarem. Aceitando tragos, aceitando trapos. Vivo num déjà vu neste...